DOS ACHADOS DA AUDITORIA
Esta é a Inspeção in loco realizada nos dias 25 a 29.09.2017 pelo Tribunal de Contas do Estado do Ceará (TCECE) na Prefeitura Municipal de Maracanaú. As falhas a seguir são resultantes da análise de contratação dos serviços.
A fiscalização do Tribunal de Contas do Estado do Ceará (TCECE), depois de ter encontrado irregularidades na auditória feita em 2017 em uma licitação (foram encontradas irregularidades em várias licitações)no município de Maracanaú no valor contatado de de R$ 11.776.800,00 (onze milhões, setecentos e setenta e seis mil e oitocentos reais)). Sugeriu que o relatório fosse encaminhamento à CÂMARA MUNICIPAL DE MARACANAÚ, para conhecimento dos atos eivados de irregularidades, bem como, ao MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ, considerando a gravidade e urgência que o caso requer para adoção das medidas que entender necessárias.
Desta forma, com base da documentação fornecida foram registrados os seguintes achados:
3.1. Adoção irregular da ferramenta de SISTEMA DE REGISTRO DE PREÇOS para execução de serviços de coleta e transporte de resíduos sólidos, poda e volumosos e de entulho de construção.
A coleta, transporte e destinação final de resíduos sólidos é um serviço de engenharia, que carece de aptidão e capacidade técnica para sua execução, como bem determina o edital 10.006/2017 em seu item “6.6”, exigindo qualificação técnica e qualificação técnico-operacional (Fl.82).
Como tal, em face de sua complexidade, pressupostos técnicos e interação direta com a saúde pública, exige:
A elaboração de PROJETO BÁSICO com elementos necessários e suficientes, que apresente nível de precisão adequado para o seu dimensionamento, com base nas indicações de estudos técnicos preliminares, que assegurem a viabilidade técnica do serviço e o adequado tratamento do impacto ambiental, e que também possibilite a avaliação do seu custo e a definição dos métodos e do prazo de sua execução (Art.6º, IX da Lei 8.666/93).
Ou TERMO DE REFERÊNCIA com indicação do objeto de forma precisa, suficiente e clara, vedadas especificações que, por excessivas, irrelevantes ou desnecessárias, limitem ou frustrem a competição (Art.3º, § II da Lei 10.520/2005).
É, portanto um serviço que envolve planejamento, coordenação, fiscalização e controle.
De acordo com a Orientação Técnica OT–IBR 002/2009 do Instituto Brasileiro de Obras Públicas – IBRAOP, um Serviço de Engenharia é toda atividade que necessite da participação e acompanhamento de profissional habilitado conforme o disposto na Lei Federal nº 5.194/66, tais como: consertar, instalar, montar, operar, conservar, reparar, adaptar, manter, transportar, ou ainda, demolir. Incluem-se nesta definição as atividades profissionais referentes aos serviços técnicos profissionais especializados de projetos e planejamentos, estudos técnicos, pareceres, perícias, avaliações, assessorias, consultorias, auditorias, fiscalização, supervisão ou gerenciamento (Arts. 6º, II e 13 da Lei 8.666/93).
Verifica-se junto ao Edital do Pregão Presencial nº 10.006/2017 que o mesmo exige QUALIFICAÇÃO TÉCNICA com registro no CREA e responsável técnico com aptidão para o desempenho da atividade pertinente ao objeto da licitação, sendo exigido, portanto um profissional de nível superior da área de engenharia (Itens 6.6.1 e 6.6.4.1 - Fl. 82 do edital).
FONTE TCECE
Considerando-se então as exigências do edital do Pregão (qualificação técnica e capacidade técnico operacional), trata-se da contratação de um serviço técnico especializado na área de engenharia. E considerando as definições integrantes das Resoluções CONFEA-CREA nº 1010 de 22/08/2005 e 1073 de 19/04/2016, de fato o é.
Sobre a contratação de serviços técnicos através de SRP transcreve-se a seguir os entendimentos da Controladoria Geral da União – CGU sobre o tema. Entende a CGU que “a utilização do Sistema de Registro de Preços – SRP para contratação de serviços técnicos especializados de consultoria, engenharia e arquitetura NÃO encontra amparo na legislação vigente, porque a licitação preordenada a registro de preços deve balizar-se pelo regramento contido no art. 15, inciso II, da Lei nº 8.666/1993 e no Decreto nº 7.892/2013, no âmbito da Administração Pública Federal.” 1 .
3.1.1. Quem seriam as “empresas detentoras dos preços registrados” citadas na CLÁUSULA SÉTIMA da Ata de Registro de Preços (Item 7.1 - Fl.345) visto verificar-se a participação somente da Contratada, a empresa BC CONSTRUTORA E INCORPORADORA IMOBILIÁRIA LTDA, com quem foi firmado O CONTRATO Nº 1010.17.09.01.01?
3.1.2. Tais empresas seriam convidadas a firmar contratações de fornecimento, através de ORDEM DE SERVIÇO. Seriam FORNECEDORAS de que objeto? Da prestação do serviço de coleta e transporte, OU de fornecimento de resíduos de poda, volumosos ou de entulho?
3.1.3. Conforme a CLÁUSULA SEXTA (Fl.104) da mesma ARG, os serviços quando “eventualmente” contratados seriam executados nos locais discriminados em Ordem de Serviço. Qual seria então a situação dos equipamentos dimensionados e dos empregados alocados, conforme estimado no Anexo I – Termo de Referência (Fls.94/97)? Ficariam em stand by aguardando demandas de serviços? Custeados por quem?
3.1.4. Considerando a eventualidade expressa na CLÁUSULA SEXTA (Fl.104) como seriam mantidos pela Contratada (neste caso a empresa BC Construtora e Incorporadora imobiliária Ltda) os custos de manutenção dos equipamentos e trabalhadores para execução dos serviços no que se refere aos salários, encargos sociais, etc, definidos no item 5.7 do Edital (Fl.80) e do item 3 – DA RESPONSABILIDADE, integrante do Anexo II – PROJETO EXECUTIVO (Fl.99)?
3.1.5. O item 12.1.1 do edital (Fl.90) informa que “A ordem de autorização do serviço emitida conterá o serviço pretendido e a respectiva quantidade, devendo ser entregue ao beneficiário do registro o seu endereço físico, ou [...]”. Com base neste item, pergunta-se: Que quantidade pré-determinada se refere? Quantidade de poda ou de entulho? E ainda, que a mesma deverá ser entregue ao beneficiário. Quem é o beneficiário neste caso? O que será entregue? O resíduo coletado, ou o serviço prestado?
3.1.6. De acordo com o Anexo II – projeto Executivo, em seu item 3.DA RESPONSABILIDADE (Fl.99), a Contratada deverá apresentar PLANO DE TRABALHO, no prazo máximo de 30 dias após a assinatura do contrato, contendo dentre outros:
I. Dimensionamento de mão de obra e de equipamentos de acordo com o edital.
Pergunta-se: Como deverá ser dimensionada a posteriori a prestação de um serviço já contratado, com prazo de execução já estabelecido, com equipamentos e equipes que deverão executar os serviços por 44 horas semanais (Item 4.PERÍODO DE EXECUÇÃO DO SERVIÇOS – Termo de Referencia (Fl.94)?
I. Cronograma físico de execução dos serviços.
Como se dará tal programação, apartada da programação financeira (exige-se somente a física), se conforme a CLÁUSULA SEXTA da ARG nº 10.006/2017, os serviços poderiam ser “eventualmente contratados” (Fl.344), e a Administração não possui a obrigatoriedade de “firmar qualquer contratação” (Cláusula Sétima – das Condições de Fornecimento – Item 7.4 – Fl.345)? E ainda, sendo que os “serviços licitados” serão executados no futuro, “nos locais, dias e horários indicados” pela Administração (Item 6.2 – Fl.345)?
III. Frequencia dos Serviços.
Como pode a Contratada apresentar Plano de Trabalho contendo Frequência dos serviços se não há cronograma físico-financeiro para execução dos trabalhos, que poderá ser demandado ou não pela Administração?
IV. Padronização dos Veículos.
A que se refere esta “padronização”? Tipo? Capacidade? Características externas apenas visuais? Ano de fabricação? Manutenção periódica? Próprios? Locados?
V. Modelos de Relatórios.
Como serão elaborados tais relatórios? Como a Administração exercerá a “análise e procedimentos”? De que itens de serviços? De quais procedimentos? De quais resíduos? Da poda ou do entulho ou de ambos? Que tipo de informações será definido pela Contratada que atenderá as demandas da Administração?
É flagrante a ausência de informações e de dados e/ou estudos técnicos preliminares nesta contratação.
Enfatize-se ainda que este caso não trata de COMPRAS e sim de SERVIÇO. A coleta, acondicionamento e transporte deste tipo de resíduo, que possui abordagem específica através de normas técnicas, e que independe de demanda de órgãos administrativos, tendo inclusive tratativas específicas direcionadas através de decisões e resoluções do CONAMA - Conselho Nacional do Meio Ambiente, que dita as diretrizes nacionais para o meio ambiente.
Convém aqui repisar esta questão, que trata-se de um serviço técnico, continuado, cujo beneficiário final é a população, a quem a Administração Municipal tem o poder-dever de atender de forma planejada, objetivando a conservação urbanística através da limpeza de vias, calçadas, praças, rios e canais dentre outros, e principalmente a saúde pública, através da manutenção desses equipamentos, e de prestar contas, por tratar-se de serviço custeado com recursos públicos municipais, sujeito à fiscalização inclusive dos órgãos do controle.
É flagrante o desatendimento ao Art.6º, IX da Lei 8.666/93, ao Art.3º, § II da Lei 10.520/2005, à Resolução 307/2002 do CONAMA e às normas técnicas da ABNT atinentes ao tema.
É descabida, confusa, sem clareza e transparência, e sem qualquer amparo técnico e legal a adoção de SRP para este tipo de serviço.
Sendo assim, e com base no exposto, a contratação de tais serviços não possui amparo legal para ser efetivado através deste PREGÃO PRESENCIAL PARA REGISTRO DE PREÇOS Nº 10.006/2017.
3.2. Destinação irregular de resíduos provenientes da construção civil (RCC – Resíduos da Construção Civil).
3.3. Ausência de licenciamento ambiental.
3.4. O ANEXO I - TERMO DE REFERENCIA DO OBJETO (Fls.94/97) integra o edital do Pregão 10.006/2017 de forma deficiente e inconsistente.
3.4.1. Ausência de cronograma físico-financeiro que expresse a programação física e financeira da prestação dos serviços.
3.4.2. Ausência de justificativas e / ou fundamentações técnicas e legais para adoção dos quantitativos de pessoal e equipamentos propostos para execução dos serviços.
3.4.3. Ausência de critérios objetivos para liquidação e pagamento das despesas oriundas desta contratação.
3.5. Ausência de orçamento básico detalhado, incluindo a composição dos custos unitários dos serviços.
3.6. A PROPOSTA DE PREÇOS PADRONIZADA apresentada pela Contratada, a empresa BC CONSTRUTORA E INCORPORADORA IMOBILIÁRIA LTDA apresentou as falhas a seguir relacionadas.
3.7. Ausência de ART - Anotação de Responsabilidade Técnica de execução dos serviços.
3.8. Anexo I – Termo de Referência do Objeto e o Anexo II – Projeto Executivo integram o edital do Pregão assinados por profissional não habilitado.
4. DAS RESPONSABILIZAÇÕES
Dos Responsáveis:
5. DAS CONCLUSÕES:
O edital de licitação deste Pregão Presencial para Registro de Preços nº 10.006/2017 prevê a contratação de serviços de coleta e transporte de resíduos sólidos oriundos de poda e volumosos e entulho de construção.
Os custos da execução desses serviços foram estimados pela Administração Municipal em R$ 11.773.629,60, por um período de 12 meses.
Os “Termo de Referência do Objeto” e o “Projeto Executivo” integram o edital registrando flagrantes irregularidades, dentre elas destacam-se as ausências de individualização dos custos unitários e de fonte (s) referencial (is), ou pesquisa de mercado incluindo de forma individualizada os insumos sobre os quais se baseiam e que não foram informados.
As ausências verificadas na impossibilidade de conhecimento do que é composto o valor global contratado, ou seja, os custos unitários dos serviços licitados que juntos formam o valor global, trás como consequência, a completa impossibilidade de elaboração de propostas fundamentadas e sustentáveis por parte das proponentes, causando flagrante prejuízo à fiscalização, não somente pela Administração, mas também pelos órgãos de controle, impossibilitando o exercício do atendimento ao Art.113 da Lei 8.666/93.
A completa ausência de informações técnicas para subsidiar os preços licitados e a especificação dos serviços, compromete sobremaneira o orçamento contratado. Não existem demonstrados preços unitários dos serviços. Não há menção ao lucro (que integra a taxa de BDI que sequer foi mencionada). O que foi intitulado como “Projeto Básico Simplificado nº 20170316016” é resultado de um “Mapa de Cotação de Preços” que registra a média de valores globais praticados pela própria Administração e mais três outras empresas (Fl28) e a partir deste documento “estima” o valor dos “bens ou serviços” (Fl.31). A própria Pregoeira do Município, que em tese, não possui nenhuma habilitação técnica para atuar elabora TODOS os documentos técnicos que norteiam a contratação e a execução dos serviços.
Tais fatos decorrem da adoção de um processo irregular de contratação de um serviço técnico de engenharia, de natureza contínua, de saúde pública, que apresenta custos significativos, que exige inclusive licenciamento ambiental, cronograma de planejamento e orçamento detalhado para sua execução, efetivado através de SISTEMA DE REGISTRO DE PREÇOS (SRP), como se pudesse estar na prateleira e ser “solicitado” e executado a qualquer momento dependendo da demanda de órgãos da Administração ou do gestor da vez.
Em decisão recente o TCU se manifesta através do Acórdão 3605/2014 – Plenário, entendendo que “[...] o aludido normativo viabiliza a contratação de serviços comuns de engenharia com base no registro de preços quando a finalidade é a manutenção e a conservação de instalações prediais, em que a demanda pelo objeto é repetida e rotineira”. Ressalta ainda o aspecto referente à previsão do Art. 10º da lei 8.666/93, que é bastante explícito na definição dos regimes de contratação, e que não há menção à possibilidade de emprego do registro de preço.
Cita no mesmo Acórdão o entendimento da doutrinadora Maria Silvia Zanella Di Pietro, que se manifesta sobre o Decreto 7.892/2013 considerando que o mesmo “ultrapassou os limites da Lei 8.666/1993, afrontando, portanto, o princípio da legalidade, ainda que tal decreto venha sendo aceito e aplicado, sem impugnação, pelos órgãos de controle, talvez pelo fato de que o sistema de registro de preços é organizado mediante procedimento licitatório”.
Sendo assim e considerando que é poder-dever da Administração motivar e justificar documentalmente seus atos. Principalmente tratando-se daqueles que envolvem o comprometimento de recursos públicos para serviços essenciais de utilidade pública e de saúde pública, que não podem sofrer interrupções e / ou paralisações durante sua execução, como é o caso deste.
Considerando que possíveis interrupções e / ou paralisações desses serviços essenciais no decorrer de sua execução ficam sujeitos à deterioração de materiais, equipamentos e principalmente da cultura da gestão. O que acarreta muitas vezes a sucessivos aditivos, às rescisões e ainda à desmobilização de empresas contratadas. Todas estas ocorrências resultam no aumento do custo para retomada. Além das perdas financeiras representa um prejuízo social pelo não atendimento ao objetivo a que o serviço se destina.
Considerando que as falhas observadas levam a uma reflexão sobre a precariedade no planejamento de serviços que se fundamentam em projetos de baixa qualidade, orçamentos estimativos deficientes, e nenhum controle ou fiscalização dos atos praticados. E que a utilização de ferramentas que aparentam agilidade e eficiência é na verdade uma ferramenta ilegal da aplicação dos recursos públicos.
onsiderando que restou inexistente a completa ausência de informações técnicas acerca da destinação final destes resíduos nos 12 meses de contratação. E que não há registros documentais (no edital ou projeto básico) que indiquem a sustentabilidade ambiental e a possibilidade de absorção desses resíduos pelo Aterro Sanitário de Maracanaú, de forma a não comprometer sua viabilidade e vida útil.
Considerando que projetos mal elaborados, incompletos, sem as informações técnicas necessárias e sem as fundamentações e fontes que o tema exige são uma fonte constante de sucessivos aditivos contratuais, e que dão uma margem quase insanável para prestação de péssimos serviços à comunidade.
Considerando que foram gravíssimas as falhas encontradas e registradas no item “3.” acima, e ainda o montante de recursos e a singularidade na prestação desse tipo de serviço, que é antes de tudo um serviço de proteção à saúde pública e ao meio ambiente.
Considerando que o contrato foi assinado em 01/09/2017.
Considerando que há periculum in mora e a probabilidade de dano ao erário.
Considerando por fim a competência Constitucional deste Tribunal de Contas e a natureza da supremacia do interesse público em serviço de tão relevância social e de saúde, sugere-se a esta Relatoria que seja adotada MEDIDA CAUTELAR a fim de suspender a presente contratação e que outro certame com a utilização das ferramentas adequadas seja implementado, conforme estabelecido nos inciso VII do art.78 da Constituição do Estado do Ceará,
E ainda, s.m.j, sugere-se também o encaminhamento deste relatório à CÂMARA MUNICIPAL DE MARACANAÚ, para conhecimento dos atos eivados de irregularidades e citados no item “3.” desta informação. Bem como, ao MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ, considerando a gravidade e urgência que o caso requer para adoção das medidas que entender necessárias.
Para finalizar, em respeito aos Princípios Constitucionais do Contraditório e da Ampla Defesa, consagrados no inciso LV do art. 5.º da Carta Magna Brasileira, combinado com o art. 5.º da Resolução n.º 02/2002, deste Tribunal ratificamos a necessidade de serem ouvidas as partes interessadas e citadas no item “4.” acima.
É A INFORMAÇÃO.
15ª INSPETORIA DA DIRETORIA DE FISCALIZAÇÃO – DIRFI, DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DO CEARÁ, FORTALEZA, 24 DE OUTUBRO DE 2017.
Conforme:
Wanda Gomes de Oliveira Murta
Engª Civil – CREA-CE 46475
Analista de Controle Externo Inspeção de Obras Públicas
Revisão:
Nikael de Carvalho Almeida
Engª Civil – CREA-CE 41958
Analista de Controle Externo
Inspetor