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sábado, 14 de julho de 2018

OS NÚMEROS DA VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER NO BRASIL




No último dia 9 de março, a Lei 13.104/15 completou dois anos desde sua promulgação. Conhecida como a Lei do Feminicídio, ela torna o homicídio de mulheres em crime hediondo quando envolve violência doméstica e familiar, e menosprezo ou discriminação à condição de mulher. Essa alteração do art. 121 do Código Penal foi fundamental para dar a visibilidade ainda perdida nos registros oficiais.


Em 2015, 4.621 mulheres foram assassinadas no Brasil, o que corresponde a uma taxa de 4,5 mortes para cada 100 mil mulheres. Com base nesses dados do SIM não é possível, contudo, identificar que parcela corresponde às vítimas de feminicídios, uma vez que a base de dados não fornece essa informação.

Conforme apontado na Tabela 6.2, ainda que a taxa de homicídio de mulheres tenha crescido 7,5% entre 2005 e 2015, quando analisamos os anos mais recentes, verificamos uma melhora gradual, tendo este indicador diminuído 2,8%, entre 2010 e 2015, e sofrido uma queda de 5,3% apenas no último ano da série.


Seguindo o padrão de evolução dos homicídios em geral, pode-se observar na Tabela 6.2, que a variação na taxa de violência letal contra as mulheres segue diferentes direções entre as Unidades Federativas, tendo o estado de São Paulo obtido uma diminuição de 34,1% nesses 11 anos, ao passo que no outro extremo da tabela, se observou um incremento de 124,4% no mesmo indicador do Maranhão.


TABELA 6.2


Digno de nota também é o fato que apenas no último ano houve uma diminuição na taxa de homicídio de mulheres em 18 Unidades Federativas. Ainda nessa tabela, enquanto São Paulo, Santa Catarina e Distrito Federal possuíam em 2015 as menores taxas, Roraima, Goiás e Mato Grosso encabeçavam a lista dos estados com maior prevalência de homicídio contra mulheres.

É necessário destacar, no entanto, que estes dados guardam diferenças significativas se compararmos as mortes de mulheres negras e não negras. Enquanto a mortalidade de mulheres não negras teve uma redução de 7,4% entre 2005 e 2015, atingindo 3,1 mortes para cada 100 mil mulheres não negras – ou seja, abaixo da média nacional -, a mortalidade de mulheres negras observou um aumento de 22% no mesmo período, chegando à taxa de 5,2 mortes para cada 100 mil mulheres negras, acima da média nacional.

Os dados indicam ainda que, além da taxa de mortalidade de mulheres negras ter aumentado, cresceu também a proporção de mulheres negras entre o total de mulheres vítimas de mortes por agressão, passando de 54,8% em 2005 para 65,3% em 2015. Trocando em miúdos, 65,3% das mulheres assassinadas no Brasil no último ano eram negras, na evidência de que a combinação entre desigualdade de gênero e racismo é extremamente perversa e configura variável fundamental para compreendermos a violência letal contra a mulher no país.

As maiores taxas de letalidade entre mulheres negras foram verificadas no Espírito Santo (9,2), Goiás (8,7), Mato Grosso (8,4) e Rondônia (8,2). Apenas sete Unidades da Federação lograram redução na taxa de mortalidade de mulheres negras por homicídio entre 2005 e 2015, sendo eles: São Paulo (-41,3%); Rio de Janeiro (-32,7%); Pernambuco (- 25,8%); Paraná (-23,9%); Amapá (-20%); Roraima (-16,6%); e Mato Grosso do Sul (-4,6%).

Os dados apresentados revelam um quadro grave, e indicam também que muitas dessas mortes poderiam ter sido evitadas. Em inúmeros casos, até chegar a ser vítima de uma violência fatal, essa mulher é vítima de uma série de outras violências de gênero, como bem especifica a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06). A violência psicológica, patrimonial, física ou sexual, em um movimento de agravamento crescente, muitas vezes, antecede o desfecho fatal.

A ampliação e o aprimoramento da rede de atendimento à mulher são fundamentais não apenas para o melhor acompanhamento das vítimas, mas também pelo seu papel na prevenção da violência contra a mulher. Um ponto importante a ser enfatizado é a necessidade de que essa rede possa ser acessada pelo sistema de saúde e não apenas pelo sistema de justiça criminal. Muitas mulheres passam várias vezes pelo sistema de saúde antes de chegarem a uma delegacia ou a um juizado, e muitas nunca nem chegam.

Em 2016, na pesquisa “Visível e Invisível: a vitimização de mulheres no Brasil”, encomendada ao Datafolha pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, com representatividade nacional, aferiu-se que 29% das mulheres brasileiras relataram ter sofrido algum tipo de violência segundo a pesquisa, sendo que apenas 11% dessas mulheres procuraram uma delegacia da mulher. A pesquisa também apontou que em 43% dos casos a agressão mais grave foi no domicílio.

Para que essa rede de atendimento funcione plenamente é necessário que ela consiga oferecer opções reais para que a mulher possa sair de um ciclo de violência. A Pesquisa de Condições Socioeconômicas e Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (PCSVDFMulher), realizada em 2016 pelo Instituto Maria da Penha-IMP em parceria com a Universidade Federal do Ceará e o Instituto para Estudos Avançados de Toulouse, na França, apresenta uma radiografia da violência de gênero no Nordeste brasileiro, que reforça a necessidade de se desenvolver ações e programas multisetoriais e multidisciplinares.

Somente com essa abordagem poderemos construir políticas públicas capazes de enfrentar a violência contra a mulher e promover uma ampla educação de gênero para que possamos, de fato, comemorar de forma permanente a redução do feminicídio.


TABELA 6.1 – NÚMERO DE HOMICÍDIO DE MULHERES – BRASIL 2005 A 2015

TABELA 6.2 – TAXA DE HOMICÍDIO DE MULHERES POR UNIDADE DE FEDERAÇÃO – BRASIL 2005 A 2015

TABELA 6.3 – TAXA DE HOMICÍDIO DE MULHERES NEGRAS POR UNIDADE DE FEDERAÇÃO – BRASIL 2005 A 2015

TABELA 6.4 – TAXA DE HOMICÍDIO DE MULHERES NÃO NEGRAS POR UNIDADE DE FEDERAÇÃO – BRASIL 2005 A 2015

FONTE: ATLAS DA VIOLÊNCIA IPEA












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